terça-feira, julho 11, 2006

Façam as vossas apostas

Apetece-me arriscar
Faz, faz a tua aposta
Apetece-te viver como quem gosta
Não é para quem quer
Mas para quem pode
Quem acode e aguenta
A tormenta de ti.

Apetece-me arriscar
Aquele arrisco de começo
E só porque te conheço e reconheço
Que vou sair a perder.
Perder limpo.
Jogo sujo.
É o que sabes fazer.

Apetece-me arriscar
Arriscar a feijões e um beijo
E uma salva de palmas ao desejo
E uma vénia às leguminosas
Às poderosas que te sustentam
Nesse vício de pretensas
Ilusões do que vivi.

Um brinde a ti.
Fibonacci

domingo, julho 09, 2006

Você me apareceu

Você me apareceu
Fez o tudo virar nada
E vice-versa
Fui submersa
A azeitona na empada que era eu
Você é dona do caroço da azeitona da empada que comeu.
Você me apareceu
Fez o nada virar tudo
Me deixou mudo
De tão tamanha
'Cê me acanha
Minha estranha
É o prazer de que sempre padeço
É do fim começo e reconheço
Que o avesso sempre esteve aqui.
Minha estranha
É o engano de minha certeza
É o insano que há na beleza
A tristeza que me faz sorrir.
Você me apareceu...
Kaleidoscopio
Uma corda fora do sítio. Aquela corda fora do sítio não incomodava ninguém. Mas era, não o podia negar, uma corda fora do sítio. Tinha vivido sempre com a guitarra com aquela corda fora do sítio. E até gostava dela. Tinha-se habituado, com o passar do tempo, àquela corda fora do sítio. Que nunca, mas nunca (sublinhe-se!) tinha incomodado ninguém.
Quando ele passou e se riu, com aquele riso que não vivia sem o olhar dirigido à pressa para baixo, tão à pressa, tão para baixo e tão cuidadosamente pensado como o cabelo desalinhado naquele seu estilo don't care at all but do like to fashion you, quando ele passou e se riu, subitamente lembrou-se da corda fora do sítio.
A corda sempre tinha sido esperta. Sabia que não pertencia aí. Ao princípio resmungava e recusava-se a afinar e a cumprir o seu trabalho (mas afinal para que lhe pagava?). Mas depois cansou-se e deixou-se soar. A partir de então, soava sempre como ela lhe obrigara que fosse, mas o seu tom angustiado de não pertencer ali estava, mesmo que não o quisesse ouvir, presente.
O olhar, o riso, o cabelo, bem o sabia, eram para outras paragens, outras partituras. E todas as noites, o ritmo blue que sentia soava na caixa daquela guitarra com uma corda fora do sítio.
Sim. A corda sempre tinha sido esperta. E um sol não é um ré. Mesmo que tente ser.
(Epílogo: Esta noite, a corda fora do sítio partiu. Partiu desta partitura com o mesmo soar triste mas, sim, finalmente livre de ser o sol que devia ter sido. Tenciono substituí-la por um ré. Quanto ao resto, creio que outro alguém terá de rever as suas cordas. A mim parecem-me muito fora do sítio. Afinadas. Mas muito fora do sítio.)
Fibonacci