sexta-feira, agosto 31, 2007

Plano

Todos temos um plano. Planos infalíveis, inquebráveis, onde mergulhamos de cabeça, devagarinho, primeiro, e depois tresloucados, deliciados, baixando as pálpebras, mordendo os lábios.
E nesse mitológico negrume respiramos devagarinho e pensamos mesmo descortinar um certo olhar de aprovação.
Uma paixão desenfreada por um plano, como um filho, nascido da nossa carne, ou pelo menos das nossas células e outras coisas cada vez mais microscópias e monstruosas.
E nessa paixão, que deveria ser leal, desconfiamos. E, por isso, guardamos uma pequenina caixa de Pandora, ou de primeiros socorros, ou de últimos planos B. Não gostamos deles, despejamos neles toda a culpa de a nossa primeira inspiração falhar e, por isso, no início nunca lhe damos a devida atenção. No início. Porque no fim nos arrependemos de o não termos pensado melhor, de não termos nunca considerado que a nossa primeira e eterna paixão, a nossa própria decisão e natureza nos ia deixar mal.
Mas deixa, deixa sempre.
E depois somos obrigados a seguir uma segunda via. Uma dor na alma como objectivo. Um 'tem de ser' desgraçado. Apenas e somente apenas porque uma parte de nós (e eu diria mesmo, a grande maioria do que quer que seja que nos constitui) se volta para trás, desesperada, e no entanto deliciada por se transformar em sal, desde que isso permita uma última imagem e um último sorriso ao que tanto nos destruiu e que, mesmo assim, continua a ser a nossa maior força.
Fibonacci

quinta-feira, agosto 30, 2007

Tempestade

Acalma-me saber que não podia ser de outra maneira; ainda respiro por saber que há amanhã.
O capitão não abandona o seu navio e eu decidi esperar com ele o fim da tempestade nem que seja no fundo do mar e muitos séculos.
Só que o reflexo da alma não espera e as minhas mãos estão cansadas, não o seguram. E a minha herança animal, essa não me deixa esquecer a vida. E assim esbracejo para não morrer por livre vontade agarrada a ti. E esbracejando vou tão contra a minha própria natureza como contra a corrente.
O frio da água em remoinho é tão penetrante que a tua mão gelada e estagnada aquece a minha: se decidiste partir, deixa-me ir também. Avisa o meu espelho, para que a minha sombra siga o meu corpo quando este um dia for resgatado.
Se o for.
Eu não quero que seja.
Mas é uma questão de sobrevivência, percebes?
Fibonacci

terça-feira, agosto 14, 2007

Igorância minha

Parece-me que há alguém que acredita em mim. Calo-me perante tamanha certeza, a curiosidade parece matar aos pouquinhos. É tão boa de ouvir, a mentira. E tão boa de sentir, a ternura magoada.
Obrigada, seja quem fores. É que não podias conhecer melhor as manhas para me deixar a sorrir. Esqueces-te que isso nada é senão a tua própria identidade?
Continua a falar, por favor. Eu calo-me. Finjo um pouco mais que estou na mais plena e ingénua das ignorâncias.
Ninguém me pode voltar a dar o que apostei e perdi. Mas tu reparaste em mim. Obrigada.
Fibonacci